O calabouço (fiscal) e a esquerda entre fantasmas e demônios.
Por Rodolpho Borges, professor de História e militante do PCB
Podemos considerar estelionato eleitoral quando já votamos esperando um estelionato eleitoral? Mais do que debatermos sobre a crítica das falhas do projeto lulista de “reconstrução” do Brasil pós-Bolsonaro, devemos entender quais lugares comuns compartilhados nos destroem como força política capaz, quais concepções temos que destruir em nós que nos colocam como cínicos apologistas do ethos neoliberal, e, principalmente, qual o processo nos trouxe para a imediata necessidade de apoiar a eleição desse governo sendo que o que ele está fazendo nós já esperávamos que fosse feito. Como sair do nó tático dado na esquerda que se vê encurralada por um governo de retórica popular praticando uma política de destruição neoliberal, sob a liderança de um partido enorme e poderoso, com capilaridade e grande poder de aparelhamento das lutas e organizações populares?
Muitos se apressam em dizer que a culpa não é do governo, mas da tal “correlação de forças”, esse fantasma intangível que nos assombra há duas décadas, que nos faz desistir dos sonhos, das felicidades e da coragem. O governo Lula, ao articular quase nada para transformá-la, age não como um opositor dessa “correlação de forças”, mas como o seu mais dedicado protetor, que se imagina dando a própria vida para que ela continue imaculada. Mas apenas se imagina, idealiza esse momento ao qual se reduz toda sua existência, momento que não passa ele mesmo de fantasia.
“São demônios os que destroem o poder bravio da humanidade! ”
A questão é que o tal governo Lula é isso. Ele não vive uma contradição entre as medidas econômicas e as promessas sociais. Ele é esse jogo retórico quase hipnótico, uma quimera que caminha no sentido do seu objetivo principal, fazendo todas as artimanhas que esse caminho demanda. Acreditar que o novo arcabouço fiscal age na contramão do que o governo propõe ao país é acreditar nas palavras de um presidente que, quando candidato, aliou-se até com o diabo para ser eleito. Apesar das promessas e de toda vã esperança que pairou sobre os círculos mais ingênuos (ou bem pagos para ser ingênuos), o projeto do governo Lula é, mais do que nunca, a gestação de uma nova velha República, insossa e estéril, neoliberal, só que fofa, latifundiária, mas cool, a “pacificação geral da nação. ”
Sem cinismos e sem ilusões!
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