Exportação de petróleo cru é recorde, Lula conduz o Brasil na rota colonial pavimentada por Temer e Bolsonaro

Por: Redação ·
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Por Felipe Coutinho, engenheiro químico e vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET). Publicado originalmente no site da AEPET

Fonte da imagem: site da AEPET

A aceleração dos leilões para exploração e produção do petróleo nos governos Temer e Bolsonaro, assim como a continuidade, com Lula, das políticas de preços relativamente altos dos combustíveis, de baixo investimento e alta distribuição de dividendos da Petrobrás, da baixa, provisória e já extinta taxação da exportação de petróleo cru e a não reversão das privatizações de refinarias e da distribuidora de combustíveis da estatal, são responsáveis pelo recorde da exportação de petróleo cru e importação de seus derivados para o Brasil. Trata-se de relação internacional do tipo colonial, onde se exporta produtos primários e importa produtos industrializados de maior valor agregado.

Exportação do petróleo cru e importação dos seus derivados

O Gráfico 1 apresenta a exportação média de petróleo cru brasileiro, em barris por dia, de 2000 até junho de 2023. [1]

Gráfico 1: Exportação média de petróleo cru do Brasil, em barris por dia

No Gráfico 1, para 2023, foi considerado o período de janeiro a junho, no qual a média de exportação diária alcançou o recorde histórico de cerca de 1,5 milhões de barris por dia. Elevação de 3 vezes em relação a 2006, ano da descoberta da reserva do pré-sal.

A possibilidade do uso do petróleo do pré-sal para o desenvolvimento brasileiro, com seu consumo no país, industrialização e agregação de valor, se transformou em mais um ciclo primário exportador, equivalente aos do pau-brasil, do açúcar, da mineração, do café, da borracha e do cacau.

O Gráfico 2 apresenta a participação relativa das petrolíferas privadas e estatais estrangeiras na exportação do petróleo cru brasileiro. [2]

Gráfico 2: Exportação relativa do petróleo brasileiro por petrolíferas privadas e estatais estrangeiras

No Gráfico 2, onde para 2023 foi considerado o período de janeiro a junho, se apresenta a crescente participação relativa das petrolíferas privadas e estatais estrangeiras na exportação do petróleo do Brasil. Se, em 2009, elas representavam menos de 10% do total exportado, em 2023, alcançam mais de 60%.

Nenhum país, continental e populoso como o Brasil, se desenvolveu pela exportação de petróleo cru ou outros produtos primários. A perspectiva de desenvolvimento é ainda menor quando a exportação é feita, e beneficia, petrolíferas estrangeiras.

Enquanto se exporta cada vez mais petróleo cru do Brasil, mais se importa de seus derivados de maior valor agregado.

O Gráfico 3 apresenta a importação média de derivados de petróleo, entre 2000 e 2023. [1]

Gráfico 3: Importação média de derivados de petróleo para o Brasil, em barris por dia

O Gráfico 3 apresenta o crescimento da importação de derivados desde 2005. Em 2023, de janeiro a junho, foram importados mais de 600 mil barris por dia de derivados, enquanto se exporta cerca de 1,5 milhões de barris de petróleo cru.

O Gráfico 4 apresenta o custo histórico pela importação dos derivados, em milhões de dólares por ano. [1]

Gráfico 4: Dispêndio anual médio pela importação de derivados de petróleo para o Brasil, em milhões US$ (FOB) por ano

O Gráfico 4 apresenta o dispêndio projetado para 2023, a partir do custo com as importações entre janeiro e junho. Em 2000, o custo total com as importações de derivados foi de US$ 3,2 bilhões, em 2023 o custo projetado alcança quase US$ 20 bilhões.

Apesar do impacto negativo para a economia e a balança comercial brasileira, há quem obtenha lucro na atividade empresarial de importação de derivados de petróleo para o Brasil.

O Gráfico 5 exibe a participação relativa das importadoras e distribuidoras privadas na importação de derivados para o Brasil.

O Gráfico 5 evidencia que desde 2015 a participação relativa das importadoras e distribuidoras privadas se elevou muito. O aumento da lucratividade da cadeia de importação se consolidou a partir de outubro de 2016, quando a direção da Petrobrás adotou a inédita, arbitrária e antinacional política de Preços Paritários de Importação (PPI). Entre 2017 e junho de 2023, os agentes privados importaram entre 65% e 76% dos derivados de petróleo para o Brasil. [2]

Gráfico 5: Importação relativa dos derivados de petróleo por importadoras e distribuidoras privadas

A hegemonia dos importadores e distribuidores privados não foi ameaçada pela produção nacional, ou importação pela Petrobrás, nos primeiros seis meses do governo Lula, quando mantiveram 67,5% de participação na importação de mais de 600 mil barris por dia de derivados para o Brasil.

O Gráfico 6 apresenta a diferença média entre os preços para importação dos derivados para o Brasil e os preços de exportação do petróleo cru brasileiro. A diferença média dos preços é um sinal do maior valor agregado dos derivados, na comparação com o petróleo.

Gráfico 6: Diferença média entre os preços dos derivados importados e do petróleo exportado, em dólares por barril

O Gráfico 6 exibe o histórico da diferença entre os preços dos derivados importados em relação ao petróleo brasileiro exportado. A diferença tem alcançado patamares recordes desde 2022, quando chegou a quase US$ 22 por barril, nos primeiros seis meses de 2023 se manteve alta, com média superior a US$ 17 por barril.

Importação e capacidade nacional de produção do óleo diesel

O óleo diesel é o combustível mais importante para a circulação de pessoas e mercadorias no Brasil, com impactos diretos e indiretos na produtividade da economia e na inflação, sendo o derivado de petróleo mais importante com relação aos seus impactos econômicos e sociais.

A importação do diesel tem alcançado patamares recordes, como se vê no Gráfico 7. [1]

Gráfico 7: Importação média de óleo diesel, em barris por dia

O Gráfico 7 apresenta para o diesel, a mesma tendência antes observada para o conjunto dos derivados de petróleo. Elevação e consolidação da sua importação desde 2016, após a adoção da política de Preços Paritários de Importação (PPI) pela direção da Petrobrás. Nos seis primeiros meses do governo Lula não se observa mudança, com quase 240 mil barris de óleo diesel sendo importados por dia.

Além dos importadores e distribuidores privados, também os produtores estrangeiros ganham com a elevação da importação de derivados pelo Brasil. O Gráfico 8 apresenta os valores pagos pela importação de diesel e os países de origem dos seus produtores, em 2022.

Os produtores dos Estados Unidos foram os principais beneficiados pelas políticas que favoreceram a importação de diesel para o Brasil em 2022. Aos estadunidenses foram pagos mais de US$ 8 bilhões. Os Estados Unidos foram seguidos da Índia e Emirados Árabes Unidos que receberam cerca de US$ 2 bilhões cada, depois a Arábia Saudita e a Holanda completam o grupo dos cinco países que mais exportaram derivados de petróleo para o Brasil em 2022. [3]

Gráfico 8: Valores da importação do óleo diesel pagos aos produtores dos cinco principais países da sua origem, em 2022

No primeiro semestre de 2023, a Rússia destronou os Estados Unidos como a principal origem do óleo diesel importado para o Brasil.

O Gráfico 9 apresenta a participação relativa dos cinco principais países produtores do diesel que foi vendido para o Brasil, entre janeiro e junho de 2023.

Gráfico 9: Participação relativa dos cinco principais países de origem da importação do óleo diesel para o Brasil, no primeiro semestre de 2023

No 1º semestre de 2023, a Rússia produziu 34% do diesel que foi vendido ao Brasil, seguida pelos Estados Unidos com 31%, Emirados Árabes e Índia com 11% e Arábia Saudita com 4%, completam os cinco principais países de origem.

Com relação a capacidade nacional de produção de óleo diesel e a política de Preços Paritários de Importação (PPI) recomendo meu artigo “Cinco Falácias sobre o Preço Paritário de Importação (PPI) praticado pela direção da Petrobrás”. [4]

Aqui trago dados atualizados para refutar a Falácia #2: “O Brasil não tem capacidade de refino para atender nosso mercado de combustíveis, logo é necessário importar e se a Petrobrás praticar preços inferiores aos de importação ninguém vai importá-los e haverá desabastecimento”

Para analisar esse argumento devemos recorrer ao desempenho histórico do parque integral de refino da Petrobrás.

Em 2014 foram produzidos 312,4 milhões de barris de diesel (fóssil) no Brasil. [5]

Entre janeiro e junho de 2023, o mercado brasileiro de diesel de origem fóssil – descontada a fração de Biodiesel – foi de 174,6 milhões de barris. É razoável projetar o consumo anual de 349,3 milhões de barris. [6]

O 1º trem da RNEST (refinaria de Pernambuco) entrou em operação em dezembro de 2014, o que aumenta significativamente a capacidade de refino e produção de óleo diesel. Em 2016, a RNEST produziu 22,2 milhões de barris de diesel. Sua capacidade instalada para a produção de diesel é de 27,4 milhões de barris por ano. Somada sua capacidade instalada ao que foi produzido pelo parque de refino da Petrobrás em 2014, antes de sua entrada em operação, pode se alcançar 339,8 milhões de barris por ano (97,3% da demanda do óleo diesel estimada para 2023 no Brasil). [5]

O 2º trem da RNEST que pode dobrar sua produção do diesel e demais combustíveis está em fase avançada de construção e pode ser concluído em prazo relativamente curto.

A capacidade de produção nacional do óleo diesel é compatível com a demanda, caso exista a necessidade de importação seria residual, de cerca de 2,7%, enquanto não se conclui o 2º trem da RNEST. Com sua conclusão, o parque de refino integral da Petrobrás alcançaria capacidade 5,1% maior que a demanda de diesel estimada para 2023.

O argumento pressupõe que não há capacidade de refino para atender nosso mercado, o que os resultados históricos demonstram que não é relevante porque a necessidade de importação é apenas residual em comparação com o que pode ser produzido aqui.

Depois se conclui que por, supostamente, existir a necessidade de importar, caso a Petrobrás não pratique o PPI, haverá desabastecimento. Ocorre que a Petrobrás não adotou o PPI desde sua criação, em 1953, até outubro de 2016 e não houve desabastecimento. O argumento não traz nenhum fato novo que justifique porque agora a consequência de não se adotar o PPI seria diferente.

A Petrobrás ao praticar preços inferiores ao PPI tende a recuperar o mercado e, caso haja necessidade, o volume residual pode ser importado por ela. Os custos médios e ponderados de produção e importação da Petrobrás sempre foram menores que seus preços. É possível adotar política de preços competitivos, baseados nos custos e na paridade de exportação do combustível brasileiro e garantir alta lucratividade da Petrobrás. [7]

O argumento inclui uma pressuposição que não foi previamente esclarecida como verdadeira, a premissa de que a Petrobrás não poderia importar os volumes residuais de combustíveis que não pudessem ser produzidos no Brasil. Trata-se de uma Falácia da Pressuposição.

Políticas antinacionais que levaram e mantem o Brasil no ciclo do tipo colonial e primário exportador de petróleo cru.

Políticas descritas a seguir tiveram impulso inicial com Dilma, notadamente a partir de 2015, com redução dos investimentos, preços altos dos combustíveis e o plano de privatização de US$ 58 bilhões dos ativos da Petrobrás, em três anos. Políticas que foram aceleradas com Temer e Bolsonaro, e têm continuidade nos oito primeiros meses do governo Lula, sem sinais de reversão. [8]

1) Política de realização de leilões para exploração e produção do petróleo em velocidade superior a demanda nacional pelo seu consumo.

2) Política de preços relativamente altos dos combustíveis, com consequente ociosidade do parque de refino nacional. Menor participação relativa da importação de derivados pela Petrobrás, se e quando necessária. Preços altos e menor concorrência que promovem maior lucratividade e mercado para importadores e distribuidores privados de combustíveis. [9] [10] [11]

3) Política de baixo investimento e alta distribuição de dividendos da direção da Petrobrás. [12]

4) Política de baixa, provisória e já extinta taxação da exportação de petróleo cru.

5) Políticas de promoção, consolidação e não reversão das privatizações de refinarias, transportadoras e da distribuidora de combustíveis da Petrobrás.
São as políticas responsáveis pelo recorde da exportação de petróleo cru e importação de seus derivados para o Brasil. Trata-se de relação comercial do tipo colonial, onde se exporta produtos primários e importa produtos industrializados de maior valor agregado.

Conclusão

A Petrobrás pode praticar preços inferiores aos paritários de importação (PPI) e obter excelentes resultados empresariais, com a recuperação da sua participação no mercado brasileiro e a maior utilização da sua capacidade instalada de refino.

Somente a Petrobrás consegue suprir o mercado doméstico de derivados com preços abaixo do paritário de importação e, ainda assim, obter resultados compatíveis com a indústria internacional e sustentar elevados investimentos que contribuem para o desenvolvimento nacional.

A Petrobrás deve abastecer o mercado brasileiro aos menores custos possíveis e garantir sua sustentabilidade empresarial, ao assegurar que suas margens operacionais sejam compatíveis com a indústria internacional, com alta capacidade de investimento e resiliente à variação do preço do petróleo.

O Brasil está sendo submetido à exploração do tipo colonial, depois dos ciclos do pau-brasil, do açúcar, do ouro, prata e diamantes, do café, da borracha e do cacau, é a vez do ciclo extrativo e primário exportador do petróleo brasileiro.

O petróleo do Brasil tem sido exportado em volumes recordes, cerca de 1,5 milhões de barris de petróleo por dia, volume equivalente a 45% da produção de petróleo cru no país.

Existe relação entre o consumo de energia, o crescimento econômico e o desenvolvimento humano. O consumo per capita de energia no Brasil é muito baixo, quase seis vezes menor em relação aos Estados Unidos e quase cinco em relação a Noruega. No entanto, quase metade do petróleo produzido no Brasil não tem sido consumido no país, está sendo exportado, em maior parte por multinacionais estrangeiras.

Enquanto se exporta o petróleo cru do Brasil, o país importa cada vez mais seus produtos refinados. São importados mais de 600 mil barris de derivados de petróleo por dia, a maior parte produzida na Rússia e nos Estados Unidos.

A política de preços da Petrobrás, desde 2016, é de paridade em relação aos preços dos combustíveis importados. Apesar mudança na retórica, a direção da Petrobrás manteve a política no governo Lula. [9] [10] [11]

A prática de preços muito mais altos que os custos de importação têm viabilizado a lucratividade da cadeia de importação e a competitividade dos combustíveis importados, em especial da Rússia e dos Estados Unidos.
O combustível brasileiro arbitraria e indevidamente mais caro perde mercado para o importado, o que resulta na ociosidade das refinarias da Petrobrás, em até 25% da sua capacidade de processamento de carga fresca, e em 13% no primeiro semestre de 2023. [13]

O consumidor brasileiro paga preços vinculados ao petróleo no mercado internacional e à cotação do dólar, além dos custos estimados de importação, apesar do petróleo ser produzido no Brasil e de haver capacidade de refiná-lo no país, enquanto isso a Petrobrás perde mercado.
De janeiro a junho de 2023, 34% do diesel importado pelo Brasil foi produzido na Rússia e 31% nos Estados Unidos.

Nenhum país continental e populoso como o Brasil se desenvolveu exportando petróleo cru e produtos primários, muito menos por multinacionais estrangeiras, e importando produtos industrializados de maior valor agregado, é preciso estancar as veias dilaceradas do Brasil e interromper este novo ciclo do tipo colonial.

Para tirar o Brasil da rota colonial e primária exportadora de petróleo cru é necessário:

1) Interromper os leilões para exploração e produção do petróleo e voltar a realizá-los em compasso com a demanda nacional pelo consumo de petróleo e de seus derivados.

2) Alterar a política de preços dos combustíveis, ocupar plenamente e ampliar o parque de refino da Petrobrás. Praticar preços justos e competitivos, compatíveis com os custos da estatal. Se, e quando necessário, a Petrobrás deve importar os derivados e assumir papel de liderança para garantir o abastecimento nacional aos menores custos possíveis.

3) Adotar política de altos investimentos, com máximo conteúdo nacional, e de dividendos, atendendo a legislação em vigor, com mínima distribuição pela direção da Petrobrás. Priorizar investimentos industriais que agreguem valor ao petróleo cru, com a produção de combustíveis e produtos petroquímicos.

4) Promover política para impedir, ou limitar severamente, a exportação de petróleo cru, como taxar elevada e permanentemente a exportação de petróleo para incentivar a industrialização e agregação de valor ao petróleo no Brasil.

5) Reverter as privatizações, com reestatização das refinarias (RLAM, REMAN, RPCC), transportadoras (NTS, TAG) e da distribuidora de combustíveis (BR) da Petrobrás.

Felipe Coutinho é engenheiro químico e vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

Referências

[1] ANP, “Dados estatísticos,” 2023.
[2] Petrobras, “Produção e Comercialização,” 2023.
[3] MDIC, “Comexstat,” 2023.
[4] F. Coutinho, “Cinco Falácias sobre o Preço Paritário de Importação (PPI) praticado pela direção da Petrobrás,” 2022.
[5] ANP, “Produção Nacional de Derivados de Petróleo (barris),” 2022.
[6] ANP, “Vendas de derivados de petróleo e etanol,” 2023.
[7] AEPET, “Proposta de nova política de preços do diesel para a Petrobrás,” 2019.
[8] Diário do Nordeste, “Investimentos da Petrobras terão queda de 40%,” 2015.
[9] F. Coutinho, “Prates anuncia fim do Preço Paritário de Importação (PPI), mas ajusta preço do Diesel ao PPI”.
[10] F. Coutinho, “O fim do Preço Paritário de Importação (PPI) é mais uma farsa,” 2023.
[11] F. Coutinho, “Fim do Preço Paritário de Importação (PPI) é uma falácia nomotética,” 2023.
[12] F. Coutinho, “Prates mantém investimento baixo e dividendo alto na Petrobrás (2T23),” 2023.
[13] Petrobras, “Relatórios de Produção e Vendas”.

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