Feminismo classista, a luta pela emancipação feminina é uma luta contra o capitalismo

Por: Redação ·

Escrito por Francisca Luciana Almeida Colares, militante do PCB e CFCAM

A opressão feminina não é um fenômeno natural, mas histórico-social, vejamos...

No nosso processo evolutivo como seres humanos passamos de seres nômades a sedentários, de seres coletivos a individualistas.

Antes da sedentarização humana, homens e mulheres tinham papeis semelhantes na sociedade, em pinturas rupestres das eras neolítica e paleolítica, encontradas no sul do continente africano, foram encontradas figuras de homens e mulheres com as mesmas armas e instrumentos de trabalho e em escavações que datam do neolítico na região de Transbaikal – Rússia, foram encontradas armas de caça nos túmulos de homens e mulheres.

A humanidade começou a dominar técnicas de cultivo e criação de animais e foi então que a divisão do trabalho começou a separar os sexos: as mulheres em casa, nas hortas e os homens caçando e guerreando. Esse período foi considerado como de economia doméstica-comunista, quando o trabalho feminino era considerado socialmente mais valioso e mais produtivo que o do homem, não se tinha uma concepção de propriedade privada, de família nuclear, os produtos dos cultivos, das caças, os animais e os filhos eram de responsabilidade coletiva; as relações afetivo-sexuais eram comuns e as crianças eram filhas da comunidade; o parentesco era definido a partir da linhagem materna (matrilinearidade).

As relações homem-mulher mudaram profundamente com a capacidade humana de multiplicar a força produtiva e acumular os produtos advindos dessa produção. A melhora na produção de ferramentas possibilitou o acúmulo de excedentes e com isso a propriedade privada, sendo o homem o detentor dessa propriedade privada. Deu-se então um processo de dissolução das estruturas e modos comunitários de relacionamento em prol da família patriarcal, a mulher também passou a ser propriedade do homem, assim como sua força de trabalho. A divisão sexual do trabalho se aprofundou e o trabalho feminino se individualizou, antes servia para a manutenção da comunidade, agora serve para a manutenção da família patriarcal.

À mulher foi destinada a esfera privada, doméstica, a reprodução biológica, educação e cuidado dos filhos, enfermos e idosos e aos homens foi destinada a vida pública. Essa divisão ficou bem clara na sociedade da Grécia antiga, onde as mulheres não podiam participar de debates públicos e políticos e assim como escravos e estrangeiros eram excluídas da democracia ateniense.

Na Idade Média a hierarquização social através de classes foi se tornando mais evidente e a condição da mulher dependia da classe social a que pertencia. No início da Idade Média era o marido que poderia ser julgado por falhas da esposa e estupro a uma mulher era visto como ofensa ao marido ou pai, ficando bem clara a relação de propriedade do homem sobre a mulher. As mulheres camponesas e de famílias artesãs já cumpriam dupla jornada de trabalho em casa e nas colheitas, oficinas e comércios. As mulheres da nobreza serviam ao casamento ou à clausura em conventos, tendo mais liberdade e poder nesse segundo espaço.

Com a industrialização a família aprofundou a sua função econômica. Para que o operário passasse o dia na fábrica era imprescindível que a mulher fizesse a comida, a roupa, cuidar da casa, dos filhos. O trabalho da mulher na esfera doméstica passou a garantir a reprodução da força de trabalho. No decorrer do séc XIX (1801 a 1900), as mulheres também passaram a vender sua força de trabalho na indústria para complementar a renda doméstica, ocupando majoritariamente setores que faziam alusão ao trabalho doméstico: setor têxtil, indústria de tabaco, telégrafos, indústria de calçados, com salários menores que os dos homens e jornadas de trabalho de 12-14 horas.

Apesar de muito se associar a organização e luta das mulheres a partir das sufragistas, a organização das mulheres através de questionamentos acerca da opressão de gênero e exploração de classe já ocorria bem antes das sufragistas. O movimento das sufragistas, também conhecido como primeira onda feminista ou feminismo liberal era composto majoritariamente por mulheres da burguesia ou da classe média que reivindicavam igualdade de oportunidades em relação aos homens da mesma classe social sem questionar as bases que sustentavam as opressões às quais estavam submetidas.

Mas antes das sufragistas, em 1828, mulheres americanas participavam ativamente das lutas antiescravistas, na Europa em meados do séc XIX as mulheres operárias se organizavam na luta pela redução da jornada de trabalho. Flora Tristan, que morreu em 1844, já questionava acondição legal e moral de subalternidade das mulheres e as condições precárias de vida e trabalho da classe operária e publicou o livro União Operária um ano antes de sua morte, viajando pela França para ler seu livro para operários e operárias 4 anos antes do Manifesto Comunista.

Muito antes no Brasil, mulheres negras também já organizavam a luta contra as opressões da sociedade: Dandara do quilombo de Palmares apagada da história ou quando muito lembrada sob a sombra do marido Zumbi de Palmares, Tereza de Benguela, que comandou a resistência do Quilombo do Piolho no Mato Grosso por duas décadas e Luíza Mahin, liderança da Revolta dos Malês na Bahia são exemplos da força da mulher negrana organização da luta contra as opressões de classe.

Num 8 de março de 1917, mulheres russas saíram às ruas contra a guerra, contra a fome e contra os baixos salários, compondo as mobilizações que integraram a revolução russa.

AlexandraKollontai é exemplo de como a emancipação feminina de forma plena somente é possível com a superação do sistema capitalista. Kollontai foi ministra no governo de Lênin e durante o período em que esteve integrando o governo bolchevique criou um escritório para proteção da maternidade e infância, abriu maternidades, creches, tornou maternidade e educação assunto do Estado, as mulheres obtiveram o direito de votar e serem eleitas, direito ao divórcio, acesso à educação, paridade salarial e direito ao aborto, ações para que as mulheres pudessem se verem livres das atividades domésticas para que pudessemassim construir a nova sociedade e é essa a principal diferença entre o feminismo classista e o feminismo liberal. Nós, feministas classistas, lutamos pela emancipação dasmulherescis e trans, não apenas pelo empoderamento individual, como prega o feminismo liberal, porque a mulher trabalhadora luta contra a opressão de gênero e contra a exploração da sua força de trabalho.

A luta pela emancipação da mulher é uma luta contra o capitalismo e enquanto esse sistema existir a emancipação feminina, em sua plenitude, será impossível.

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