Ilha de Maré: dos posseiros aos grileiros – o que faz o Estado?

Por Cheyenne Ayalla - O Momento

Durante os dias 2 a 6 de outubro ocorreu a Missão coordenada diretamente pelo Governo Federal, na qual uma equipe de advogados, defensores de direitos humanos, promotores, e agentes da segurança pública visitaram alguns quilombos, terras ribeirinhas e áreas tradicionais em Salvador e arredores. Essa missão, que teve seu estopim bastante triste e perturbador, ocorreu devido ao assassinado de Maria Bernadete Pacífico, mais conhecida como Mãe Bernadete, uma ialorixá, ativista e líder quilombola brasileira. Ela era coordenadora da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos e líder do Quilombo Pitanga, em Simões Filho.

Nisso ficou visível a vulnerabilidade e insegurança que esses povos vivem, sobretudo, devido ao avanço do agronegócio. Os líderes quilombolas, tradicionais, indígenas e ribeirinhos, mesmo estando no Programa Proteção, como foi o caso de Mãe Bernadete, vivem na incerteza de que suas vidas serão preservadas. Um desses casos em que a instabilidade e as ameaças se voltam a comunidade é na Ilha de Maré, mais especificamente, na comunidade de Bananeiras onde há diversas barreiras para esses povos, que em sua imensa maioria vivem da subsistência por meio do marisco e da pesca e são constantemente assolados pela contaminação dos seus mangues, especulação imobiliária e de grileiros e posseiros a mando do capital. Tais barreiras se constituem, dentre outros fatores, pelo fato de sua luta por sobrevivência estar ligada diretamente a defender a fauna e flora, assim como a preservação do território interferir no maior bem do capitalismo: a Propriedade Privada.  Negligenciada e invisibilizada pela Prefeitura de Salvador, a comunidade vive na marginalidade dos recursos mínimos de sobrevivência como acesso a saneamento básico e saúde. Nesse entendimento de uso-território há uma articulação entre a comunidade e o grupo de pesquisa da Universidade Federal da Bahia – Geografar – a qual com os fomentos da Pesquisa de Extensão se produz a medição exigida pelo Incra de território que deve ser demarcado.

A princípio, os órgãos devem estar a par dos direitos e deveres do cidadão e os dois mais citados e criticados devido a inércia diante da situação permeiam duas esferas: federal e estadual. Na primeira, o INCRA, Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, que tem como objetivo central realizar a reforma agrária, garantida constitucionalmente, manter o cadastro nacional de imóveis rurais e administrar as terras públicas da União. No entanto, sua função, como todo e qualquer pasta advinda do estado burguês, é colocar-se como uma entidade que arrefece a luta de classes bem como possui rotinas permeadas pelas burocracias e imensidão de processos, não só não cumprindo seu intuito como também mantendo esse imobilismo. Na segunda, o INEMA, Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos que se encontra em modus operandi ainda mais reacionário que o primeiro, e, quando não autoriza, faz vistas grossas diante da degradação e destruição da fauna e flora.

Embora desde 2017 exista um plano piloto de rearticulação territorial com o intuito de dirimir impactos ambientais e socioeconômicos na comunidade, nunca foi colocado em prática e assim a ilha da Baía de Todos-Os-Santos cai no esquecimento dentro das gestões da União Brasil. Tanto na visita da Missão à comunidade quanto na audiência do dia 06 de outubro de 2023 na Defensoria Pública em Salvador, o povo relatou todos os ferimentos aos direitos humanos. Durante essa semana, vários relatos e provas cabais demonstraram que a realidade da Comunidade de Bananeiras, do Quilombo de Ipitanga e outros assentamentos eram similares e os principais líderes e defensores do território e de suas tradições vivem sob medo e ameaças. Foi notório, também, não só a negligência, mas a leniência das próprias autoridades públicas. Além das diversas infrações de cunho material e social, há uma infeliz e comum realidade do estado baiano, o abandono da juventude dessa localidade a qual é assolada pelo desemprego, criminalidade e pelo tráfico de drogas. Nisso, a resposta principal do governo estadual petista é o uso truculento da máquina mortífera que é a força repressiva: a polícia militar. Uma juventude a qual carece de uma perspectiva de futuro devido a toda sua realidade material calamitosa, fruto de todo o processo de abandono do poder público. A comunidade com um esforço hercúleo se faz presente para manter essa juventude a par de suas tradições e garantir sua sobrevivência que é constantemente ameaçada pela mão do estado.

Nesse sentido, apesar de existir uma esfera Federal que trata da defesa dos direitos desses povos à luz do Ministério de Estado da Igualdade Racial, dirigido por Aniele Franco, não há interesse em desfazer a conciliação de classes orquestrada pelo governo petista. Dessa maneira, as 3 esferas – municipal, estadual e federal – e as forças repressivas (a polícia) se mantém como agentes para garantir os interesses da burguesia, portanto, do agronegócio e da especulação imobiliária. Nessa equação, as contradições dentro da social-democracia e seu caráter de atender sempre as classes mais abastadas traduz o significado de Estado colocado por Lênin, como aquele que nunca atenderá aos interesses dos trabalhadores. Sendo reflexo disso a exploração, o desmatamento, a morte da fauna e flora e o genocídio da população. Desse modo, todo revolucionário deve defender a destruição do Estado Parasita, em outras palavras, do Estado Burguês.

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