O Novo Ensino Médio veio para ficar. Será?

O Novo Ensino Médio veio para ficar. Será?

Por: Redação ·

Resposta ao artigo escrito pelo novo secretário da educação, publicado na revista Metrópoles dia 08 de junho

Por Lenina Vernucci da Silva, professora da Rede Pública Estadual, Mestra em Ciências Sociais pela UNESP de Araraquara e militante da Unidade Classista de São José do Rio Preto.

O secretário que assumiu a pasta da educação em São Paulo escreveu um artigo onde afirmou estar aberto ao diálogo para fazer acontecer aquilo que, à época, Michel Temer buscou inserir goela abaixo após assumir o governo, por meio de golpe. Só essa frase já contradiz uma possível abertura ao diálogo, afinal, um projeto que ignorou vozes da educação para fazer uma escuta ativa com empresariado, não pode ser chamado de democrático. Mas, já que deu abertura, vamos conversar.

Com o velho, porém sedutor - e equivocado - argumento de que o problema da educação é um currículo enfadonho que não condiz com a sociedade do Século XXI (sociedade esta que se mostra mais atrasada do que o século anterior – que por sua vez já era problemático e febril, conforme entoa a música) a reforma veio para inovar e atrair a juventude denominada pelo empresariado presente na educação pública de “nem nem” (“nem” estuda e “nem” trabalha) e fazer com que volte e permaneça na escola. Uma observação irônica importante: O “Novo Ensino Médio” recebeu a sigla NEM.

O foco, para quem não está a par do debate, é proporcionar um ambiente que supostamente valorize os saberes e interesses dos jovens, formando-os como protagonistas e valorizando seus projetos de vida. A propaganda feita pelo governo da época (que aprovou por meio de medida provisória essa nova educação) foi muito sedutora: parecia que “Malhação” estava de volta ao topo: juventude descolada, decidida e participante, caminhando alegremente à escola acolhedora que possibilitaria um voo alto de acordo com suas vontades.
Um bimestre de experimentação e, de fato, pouco, secretário! Mas não é preciso mais tempo para perceber quando algo está fadado ao fracasso. Sabe por quê? Porque diferente da juventude que não terá acesso ao conhecimento de qualidade, sistematizado e acumulado pela humanidade, nós tivemos e é possível perceber que a propaganda precisou ser muito boa e envolvente justamente pelo produto ser muito ruim.

Os jovens que estudam na escola pública não são decididos e descolados, pois a vida é dura e está cada vez mais feroz, agressiva e injusta para com eles. Esses jovens estão doentes e adoecendo junto com nosso país, abandonado por uma política vulgar e cruel, além de higienista. Eles não vão voar, pois mal conseguem andar com seus pés machucados de pisar em ruas violentas, sujas e abandonadas.
Suas frases feitas, senhor secretário, não podem mascarar a dureza da vida. Não só já se jogou a criança com a água, como sujou-se todo o rio e nunca mais vamos lavar ninguém. E atrair novos docentes para suprir a falta com a nova carreira é um jogo ainda mais baixo, pois não se esclarece essa carreira de forma decente, promovendo a contratação privada de docentes para cargos públicos. É o cúmulo! Nosso país tem um histórico muito ruim em relação ao funcionalismo e, não bastasse, a confusão público-privado é latente. Acabar com o funcionalismo público na educação afirmando valorizar a mesma é engodo e, mesmo sua propaganda e discursos, não podem mascarar o real: a desigualdade entre alunas e alunos será sim aumentada.

A realidade é que não queremos postergar a reforma. Queremos revogá-la. Ela não vai nos colocar perto de índices internacionais porque a educação é parte do problema. É isso o mais difícil de ser mostrado para vocês, governantes de um Estado que não governa para o povo: a educação é parte da sociedade. Ela não vai salvar ou resolver o problema se a sociedade como um todo não se transformar radicalmente, em essência e não aparência.

Por fim, em seu texto, o secretário traz muito números. Números são ótimos para auxiliar na compreensão de um problema, mas também podem servir para disfarçá-los. Ora, essa consulta pública foi outro engodo e isso é muito claro: o
diálogo conosco, docentes da rede pública foi ignorado se comparado com o diálogo com as grandes fundações “parceiras da educação” (que parceria hein?!). As consultas foram atropeladas e não são reais.

O Novo Ensino Médio veio para ficar? Veremos, porque nós viemos e continuaremos vindo para lutar! E não porque somos, como o artigo afirma, “corporativistas e conservadores de um ensino ultrapassado”, mas porque acreditamos que para a educação avançar é preciso que o ensino tenha foco no conhecimento de qualidade, na valorização profissional do funcionário público e, principalmente, no diálogo efetivo com a comunidade escolar sem intermédio de empresas privadas cujo único interesse é o lucro.

A escola tem sim que ser um lugar acolhedor e que saiba lidar com a diversidade de pensamentos e subjetividades. Mas ela é o local, antes de mais nada, por excelência, do conhecimento científico. Se for para um jovem frequentar a escola para valorizar seus próprios saberes qual a vantagem da escola então? Se é para se ter o que já se tem, o sentido se perde. A educação é para nos tirar do comodismo, é para trazer o conflito que leva ao conhecimento, à novas perguntas, para problematizar as relações e a própria vida.

Educar é movimento, é dialética, é transformação. Esse “novo ensino médio” nasceu velho demais!  Quer resiliência e conformidade e vai na contramão da democracia. É urgente que a educação seja compreendida como algo que está além de ser apenas a cura para uma doença que ela não criou, mas é parte. A educação exige a prática da liberdade de criação. É preciso uma nova sociabilidade para que se eduque um novo ser humano!


Vamos ao diálogo!

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