Os BRICS fazem pouco frente ao maior evento dos nossos tempos

Os BRICS fazem pouco frente ao maior evento dos nossos tempos

Por: O Poder Popular · Imagem: @contra_capital_ no Instagram.

Por Ghabriel Ibrahim - militante da UJC-RJ

Se querem formar um bloco que assuma protagonismo no cenário global, é necessário frear o genocídio israelense para frustrar o imperialismo e salvar a humanidade.

 O estado genocida de Israel é uma literal ameaça à humanidade

Se tratarmos “humanidade” no sentido figurado, parece evidente que o genocídio amplamente documentado perpetrado pelo estado de Israel já teve efeito devastador. Entretanto, os efeitos objetivos de sua política genocida devem ser sentidos a longo prazo por toda a população humana: nos dois primeiros meses de ofensiva, somente em Gaza houve mais emissão de gases de efeito estufa que o que constitui a soma anual de todas as emissões dos 20 países mais vulneráveis às mudanças climáticas (cerca de 281 mil toneladas de CO2, mais de 90% destas atribuídas às ações de Israel) [1]. De lá pra cá, Israel intensificou os ataques e destruiu cerca de 88% do território de Gaza fazendo uso de 125 mil toneladas de bombas [2]. No meio de 2024, estimava-se que as emissões de gás carbônico produzidas chegavam a 60 milhões de toneladas. Segundo o pesquisador Benjamin Neimark, os dados são estimados porque “os exércitos são eximidos de prestar contas”. Ainda segundo Neimark, “é como se vivêssemos num mundo em que as emissões de um caça F-35 fossem livres de carbono e não contassem” [3]. Além das emissões produzidas por carros, mísseis, foguetes, drones e caças, a água da região foi duramente afetada. É importante notar que o regime de apartheid imposto aos palestinos desde antes do começo dessa nova ofensiva já reduzia dramaticamente o acesso a água tratada e esgoto em Gaza. Com a destruição da rede de saneamento, esgoto bruto vem sendo despejado no Mediterrâneo, mais de dois terços de terras agriculturáveis foram destruídas por Israel e cerca de 80% das árvores de Gaza foram derrubadas [4]. A sanha destrutiva dos sionistas é tão grande que estima-se que a limpeza e processamento dos destroços de Gaza pode durar 40 anos e emitir 90.000 toneladas de gás carbônico [5]. Apesar de posicionamentos diversos - alguns contundentes - contra Israel por parte dos principais membros dos BRICS, é necessário fazer mais: Israel e o imperialismo norte-americano são indissociáveis. Como notou o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, Gaza é como um “experimento dos megarricos contra o Sul Global [5]. Entre outras coisas, é urgente que os BRICS liderem globalmente políticas de inovações em desenvolvimento que levem em conta a gravidade da crise climática no que se refere à manutenção de condições mínimas para a existência humana.

B

Embora no dia 23 de julho de 2025 o Itamaraty tenha emitido nota anunciando que o governo brasileiro está em fase final de adesão ao processo que tramita na ONU acusando Israel de genocídio, a venda de petróleo brasileiro ao estado sionista subiu 51% desde outubro de 2023 [5]. É possível estimar que cerca de 3% do petróleo consumido por Israel tem origem no Brasil [6]. A Petrobrás é citada expressamente no relatório “From economy of occupation to economy of genocide” (Da economia da ocupação à economia do genocídio, em tradução livre)” como tendo papel importante nas exportações de petróleo bruto para Israel, sendo o quarto país que mais exporta petróleo e derivados para a máquina genocida. Além disso, a ação movida pelo Estado brasileiro para repatriar políticos que estavam em Israel em meados de junho durante a resposta iraniana à nova ofensiva israelense evidencia que a direita brasileira tem grande interesse em “intercâmbios” com os sionistas desde que isso signifique a aquisição de métodos e de equipamentos para reprimir e violentar a juventude negra, indígena, quilombola e/ou periférica. As armas de Israel, muitas funcionando com petróleo brasileiro, matam na Palestina e no Brasil.

R

Desde 2014 a Rússia é um dos maiores fornecedores de petróleo cru para Israel, assumindo o posto de principal fornecedor no ano de 2016. Apesar de hoje aparentemente este “título” pertencer ao Azerbaijão (país que ainda não ingressou oficialmente nos BRICS, embora tenha feito pedido oficial em 2024), se somarmos as exportações de petróleo bruto do Cazaquistão (país parceiro dos Brics, mas não membro pleno) e da Rússia, a quantidade passa a ser relevante. Essa soma é pertinente porque, de todo modo, o petróleo bruto deve sair pelo mar Cáspio através sobretudo do porto russo de Novorossiisk.

I

Um dos papeis regressivos que o estado genocida de Israel cumpre há décadas a nível internacional é o de fornecedor de armas e treinamento para forças reacionárias pelo mundo. Isso ocorre claramente no caso já mencionado do Brasil, sobretudo com as polícias militares, mas é ainda mais patente no caso da Índia. A Índia foi o primeiro país não árabe a reconhecer o estado palestino, mas desde que o fascista Narendra Modi assumiu o poder tornou-se mais interessante estabelecer relações com os sionistas. Em 2017, Modi se torna o primeiro Primeiro-Ministro da Índia a visitar Israel [7], e em 2018 a Adani Enterprises, principal bandeira do bilionário indiano Gautam Adani para mineração de carvão, fechou uma associação estratégica com a Elbit Systems, maior produtora de armas israelense. A associação recebeu o nome de Adani Elbit Advanced Systems India Limited, e é responsável pela produção de mais de 80% dos drones usados pelo exército sionista [8]. As relações, porém, não são somente econômicas: é evidente a afinidade ideológica entre o Bharatiya Janata, partido de Modi, e o Likud de Netanyahu: na Índia, a ideia é imprimir a supremacia hindu custe o que custar. O racismo os une, e Modi gasta na casa dos bilhões com armas israelenses para oprimir paquistaneses, o povo de Caxemira e para manter os tensionamentos na fronteira com a China.

C

A China é outra das nações dos BRICS a dar declarações duras contra Israel. Recentemente, isso ocorreu de modo mais marcante após o ataque tresloucado do imperialismo contra o Irã, mas o que parece é que não há nada além do interesse da própria China em expandir sua influência política como mediadora na região. As tensões que surgem em termos diplomáticos reduzem muito no âmbito econômico: A China é o maior parceiro comercial de Israel no Leste Asiático e a parceria expande a infraestrutura israelense [9]. Em termos econômicos, a China concretamente não seria prejudicada caso rompesse relações com Israel, mas o embaixador chinês em Israel Xiao Junzheng parece ter a clara missão de manter relações bilaterais com os genocidas. Junzheng chega ao cúmulo de afirmar que “muitos chineses acreditam que após a guerra ou conflito, Israel entrará num novo período de paz, estabilidade e desenvolvimento, o que nos trará uma enorme oportunidade de cooperação em alto nível em diferentes campos” [10]. Resta saber se a vida do povo palestino é um preço baixo o suficiente a pagar para a China. Além disso, caso Israel concretize a limpeza étnica de Gaza, evidente plano, como ficará a diplomacia no Oriente Médio? Não terão reforçado seu papel de “polícia”? Os EUA não terão saldo positivo? As lideranças europeias, avessas a qualquer protesto pró-palestina, não terão empurrado suas bases para a extrema-direita?

S

Entre os 5 países principais dos BRICS, a África do Sul parece ser o que toma posições mais duras. Conforme já dito, foi o país que denunciou oficialmente Israel por genocídio ao Tribunal Internacional de Justiça. A África do Sul, porém, é um dos três países que historicamente mais fornece carvão à Israel (junto com a Colômbia e a já citada Rússia), e as exportações de carvão parecem ter crescido desde que Gustavo Petro, presidente colombiano, decidiu parar de fortalecer o genocídio [11] [12] [13]. É necessário avançar com medidas concretas para enfraquecer Israel e o imperialismo estadunidense.

O QUE QUEREM OS BRICS?

Está evidente para todos a relação estreita entre o imperialismo estadunidense e o sionismo. Se os BRICS desejam desafiar a hegemonia norte-americana, é urgente impor ao regime genocida de Israel uma derrota política o quanto antes, afetando, por conseguinte, o coração do império. Entretanto, manter as relações comerciais com Israel normalmente não é só um erro político: significa dar prosseguimento a uma crise humanitária que põe em risco a própria humanidade. Se seres humanos sendo fuzilados ao implorarem por comida não instam ações, se crianças desmembradas não urgem medidas duras, se esfaimados caindo pelas ruas não provocam sensibilização, que as nobres lideranças desse bloco ainda por se consolidar pensem que nenhum deles será o “país do futuro” se não houver futuro. Israel é inimigo da humanidade e (e porque) é inimigo do meio ambiente, e já passou da hora de cessar as relações comerciais para não sermos todos levados ao mesmo buraco.

REFERÊNCIAS
[1] https://www.brasildefato.com.br/2024/01/09/ataques-israelenses-em-gaza-tem-impacto-tambem-nas-emissoes-de-gases-na-atmosfera-diz-estudo/
[2] https://www.ihu.unisinos.br/654884-gaza-sob-os-escombros-de-125-mil-toneladas-de-bombas-palestinos-tentam-resistir-a-fome-e-a-sede-entrevista-especial-com-arlene-clemesha
[3] https://www.euronews.com/green/2024/06/07/jet-fuel-bombs-and-concrete-the-60-million-tonnes-of-carbon-generated-by-israels-war-on-ga
[4] https://veja.abril.com.br/agenda-verde/catastrofe-ambiental-pode-inviabilizar-futuro-da-faixa-de-gaza/
[5] https://www.theguardian.com/world/2025/jul/22/gaza-rubble-environment-emissions-impact#:~:text=In%20June%2C%20a%20study%20led,tonnes%20of%20CO%202e.
[6] https://jacobin.com.br/2025/07/o-sul-global-contra-o-envio-de-armas-para-israel/
[7] https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2025/07/12/combustivel.htm
[8] https://sindipetrosp.org.br/atrrtigo-o-petroleo-brasileiro-e-o-genocidio-palestino/
[9] https://www.dailysabah.com/opinion/columns/the-new-india-israels-main-non-western-ally
[10] https://www.stopadani.com/adani_groups_business_with_israel
[11] https://web.archive.org/web/20110924073035/http://english.cri.cn/6909/2011/09/20/195s659185.htm
[12] https://www.jns.org/a-lie-repeated-1000-times-is-still-a-lie-chinas-israel-envoy-hits-back/
[13] https://mediadon.co.za/2024/08/22/cosatu-supports-the-call-on-glencore-to-stop-sending-coal-to-israel-fuelling-apartheid-and-genocide-is-a-crime/
[14] https://mg.co.za/thought-leader/2025-06-25-coal-and-south-africas-complicity-in-the-genocide-in-gaza/
[15] https://mediadon.co.za/2024/08/22/cosatu-supports-the-call-on-glencore-to-stop-sending-coal-to-israel-fuelling-apartheid-and-genocide-is-a-crime/

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