Pulverização irregular por drones expõe famílias a contaminação
Por Nathan Monte - Jornalista militante do PCB Ceará
Agronegócio avança em Limoeiro do Norte com drones, após revogação de proteção legal; famílias do interior do Ceará denunciam catástrofe sanitária
Mais de mil famílias travam uma luta diária de sobrevivência contra a pulverização de agrotóxicos por drones. O embate ocorre na comunidade Cabeça Preta, na Chapada do Apodi, a 277 km da capital Fortaleza. O veneno é aplicado em um bananal localizado a cerca de 15 metros das residências e da escola, contrariando a distância mínima de 30 metros prevista pela lei estadual.
Na escola, que atende mais de 300 crianças, os relatos de sintomas como dores de cabeça, náuseas, vômitos e diarreia se tornaram frequentes. Moradores também relatam que o cheiro dos produtos químicos invade as casas à noite, tornando difícil dormir e gerando episódios de tremores, tontura e mal-estar recorrente. Segundo os relatos, os problemas de saúde coincidem com os períodos de pulverização e toda a comunidade apresenta sinais de contaminação. Adultos e crianças são afetados, mas as crianças sofrem de forma mais intensa.
De acordo com especialistas, os agrotóxicos podem causar efeitos agudos como irritações, sintomas digestivos e neurológicos, e crônicos, incluindo câncer e malformações congênitas. Há evidências de impacto sobre fígado, pulmões, sistema nervoso e desenvolvimento infantil também.
Retrocesso na saúde e meio ambiente
Até dezembro de 2024, a Lei Zé Maria do Tomé (Lei nº 16.820/2019) proibia a pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará. A legislação, fruto de mobilização popular e em homenagem ao líder comunitário assassinado por denunciar o uso de agrotóxicos, foi revogada pela Lei nº 19.135/2024, sancionada pelo governador Elmano de Freitas (PT).
A nova lei, de autoria do deputado estadual Felipe Mota (União Brasil), permite a pulverização por drones desde que respeitada a distância mínima de 30 metros de áreas sensíveis, o que, segundo os moradores, não ocorre.
A Procuradoria Geral de Justiça (PGJ) pediu a suspensão da nova lei, alegando que não há estudos que a justifiquem e classificando-a como “retrocesso”. A Lei Zé Maria do Tomé é de autoria de Renato Roseno, com subscrição do próprio Elmano de Freitas, então deputado estadual. À época de sua aprovação, em 2019, a lei destacou o Ceará como pioneiro em medidas dessa natureza.
Em Limoeiro do Norte e região, diversos estudos apontam para um aumento da mortalidade por câncer relacionado ao uso de agrotóxicos nos últimos anos. No Brasil, entre 2010 e 2022, foram notificados oficialmente mais de 124 mil casos de intoxicação, segundo o Sistema Nacional de Agravos de Notificação (Sinan).
Resistência
No início do ano de 2025, diversos movimentos sociais, partidos políticos, comunidades e setores da Igreja Católica lançaram uma campanha pela revogação da lei que permite a pulverização aérea de agrotóxicos no Ceará.
Conhecido como Movimento Revoga Já!, eles realizam um plebiscito popular em diversas regiões do estado com o objetivo de dialogar com a população sobre os perigos representados pelo uso intensivo de agrotóxicos, bem como pela prática da pulverização aérea.
O Movimento mantém uma página no Instagram, onde é possível acompanhar as ações e desdobramentos dessa luta, além de convidar todas e todos a participarem. Nos últimos meses, o Revoga Já! vem ganhando certa notoriedade nacional, ampliando o debate sobre os impactos dos agrotóxicos para além das fronteiras do estado.
Reforçando a importância da mobilização popular, o Movimento afirma que é por meio da luta coletiva que podemos construir mundos possíveis, livres de veneno e de ameaças à vida.
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