Evasão cresce: jovens de universidades privadas enfrentam dificuldades para continuar estudando

Evasão cresce: jovens de universidades privadas enfrentam dificuldades para continuar estudando

Por: O Poder Popular ·

3 em cada 10 estudantes de universidades privadas abandonam os estudos. Nos cursos EaD, o número é ainda maior, de 40%. Ao mesmo tempo, empresas do ramo educacional anunciam milhões em receita e capital na casa dos bilhões para garantir sua expansão.

Editorial

Jovens de diferentes faculdades particulares tem relatado dificuldades para se manter nos cursos. As reivindicações dos estudantes são comuns e vêm de conhecidas instituições de ensino como a Anhanguera, UNIP, UNINOVE, Anhembi Morumbi, FMU, Mackenzie, Faculdade das Américas e Estácio. De acordo com os estudantes, essas dificuldades já existiam mesmo antes do início da pandemia, mas foram aprofundadas principalmente por medidas tomadas pelas mantenedoras para aumentar suas taxas de lucro durante esse período, mesmo no contexto de crise. Os relatos mais comuns são as demissões em massa de professores, aulas remotas superlotadas com mais de 500 alunos de diferentes regiões do país, aumento das mensalidades e persistência no modelo EaD, mesmo em cursos que anteriormente eram presenciais. Foram também relatados sobrecarga dos funcionários do setor administrativo dessas instituições, dificultando qualquer acesso a informação e, em alguns casos como da FMU, ocorreram perdas de matrículas e documentos dos estudantes.

Formação superior x lucro das empresas

Todos estes problemas se somam as históricas dificuldades que a juventude enfrenta para conseguir estudar no setor privado, pois este não garante qualquer política de permanência, mesmo perante todos os repasses públicos que são determinantes para a sua lucratividade e crescimento. São comuns os relatos de alunos e alunas sobre as dificuldades para se alimentar, ter acesso aos materiais e acesso a cursos de capacitação, sendo que ao mesmo tempo essas pessoas enfrentam duplas e até triplas jornadas, além de demorarem para se deslocar na tentativa de conciliar trabalho e estudo, buscando uma oportunidade melhor de trabalho. Essas instituições, na sua grande maioria, utilizando de recursos públicos da educação, abriram capital nas bolsas de valores do Brasil e de Nova York impondo aos estudantes a vontade de seus acionistas. Os jovens trabalhadores reclamam que essas instituições não só se negam a implementar políticas de permanência, (bandejões, bibliotecas, creches e cursos gratuitos de idiomas), como também têm retirado as escassas politicas existentes, como o corte nas cotas de impressão na Universidade Presbiteriana Mackenzie que afetou principalmente seus estudantes bolsistas. Além disso, não houve por parte dessas instituições qualquer negociação quanto às mensalidades, ao contrário, o órgão em que elas se reúnem, o sindicato das mantenedoras do ensino superior (SEMESP), divulgou nota anunciando o posicionamento fechado dessas instituições quanto ao aumento do valor das mensalidades para os anos de 2020, 2021 e 2022, período de maior impacto da pandemia e do desemprego, que forçou diversos estudantes a terem que optar por pagar as contas de casa ou o abandono dos estudos.

Estes relatos se relacionam amplamente com os dados divulgados recentemente pelo próprio SEMESP, demonstrando que, em 2021, cerca de 3,5 milhões de estudantes evadiram do ensino superior privado e a inadimplência atingiu, pela primeira vez, 10% dos alunos e alunas. Paralelamente, dados recolhidos pelo professor Allan Seki, da UFSC, demonstram que as grandes mantenedoras das faculdades privadas do país, representadas pelo SEMESP como a Ânima (dona da Anhembi Morumbi e FMU), a Cogna (dona Anhanguera) e a YDUQS (dona da Estácio), conquistaram, além da expansão garantida pelo governo brasileiro, uma receita na casa dos milhões e, no caso da YDUQS, a maior do ensino brasileiro: um caixa na casa dos bilhões para investir na expansão de polos EaD e presenciais.

O EaD como solução

A intensa campanha pela introdução e avanço da educação à distância como caminho para solucionar os problemas dos jovens trabalhadores no acesso e permanência em cursos de qualificação foi intensificada durante a pandemia.  Figuras conhecidas como a de Jorge Paulo Lemman, dono de marcas como Americanas, Abinbev, Burguer King e Kraftz Heinz, tornaram-se grandes entusiastas da campanha no governo e na mídia em defesa da educação superior online, tendo conquistado, através da Portaria 2.117/2019, que 40% de todos os cursos, mesmo presenciais, fossem ministrados à distância. No entanto, os anos subsequentes demonstraram uma grande quantidade de jovens no EaD enfrentando dificuldades semelhantes ao ensino presencial quanto a sua permanência, carecendo das mesmas coisas (bibliotecas, creches, bandejões e cursos de idioma) além de terem que arcar as altas mensalidades, sendo que os gastos dessas empresas despencou na pandemia. Este resultado na implantação do EaD é explicitado pelo mesmo SEMESP que aponta uma evasão acima de 40% nessa modalidade das instituições privadas, maior do que nos cursos presenciais que bateram 36% de evasão no ano de 2021, mesmo período em que o próprio Jorge Paulo Lemman aumentou sua inserção no ramo da educação adquirindo 51 unidades do Cogna, além de já ser mantenedor da Insper e das fundações Estudar e Lemann, o que demonstra a contradição entre os interesses privados e a boa formação dos estudantes dessas instituições.

Publicado originalmente no Jornal O Futuro de São Paulo: https://www.ofuturodesp.com.br/evasao-cresce-jovens-de-universidades-privadas-enfrentam-dificuldades-para-continuar-estudando/

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